Escrito por: Anita de Souza Silva
Revisado por: Lucas Galdioli
O relatório do Índice de Abandono Animal no Brasil, um projeto global liderado pela Mars em parceria com especialistas e organizações de bem-estar animal, visou coletar informações para compreender o número de cães e gatos sem acesso adequado aos cuidados necessários. A iniciativa objetivou promover ações mais embasadas e direcionadas para ajudar a reduzir o número de abandonos e garantir os cuidados necessários para melhoria da qualidade de vida e longevidade dos animais de estimação. O estudo enfoca em três áreas principais: prevenir pets indesejados, garantir cuidados necessários e manter os pets em casa.
A pesquisa analisou 930 fontes para selecionar mais de 180 bases de dados em 20 países, realizou quase 30.000 pesquisas com tutores e não-tutores de animais de estimação e entrevistou mais de 200 profissionais que trabalham na área de animais não domiciliados. Para análise geral, os números são provenientes de estimativas de pets abandonados com base em pesquisas primárias e secundárias conduzidas pela Euromonitor International (EMI) em 2022-2023 e estimativas de animais de estimação coletadas pela Mars Consumer & Marketing Insights (CMI), além de pesquisas com amostras públicas (on-line e em campo) de proprietários e não proprietários de animais de estimação realizadas pela Kantar em 2022, e profissionais do setor de animais de estimação, como abrigos e organizações sem fins lucrativos (ONGs) que trabalham com a falta de moradia para animais de estimação.
Para o Brasil, o estudo demonstra que possui 121.3 milhões de cães e gatos, sendo 82,1 milhões cães e 39,2 milhões de gatos. Quando relata da problemática do abandono, o estudo revela que tem 30,2 milhões de cães e gatos abandonados no Brasil, representando 25% do total de animais abandonados e um nível abaixo da média quando comparado aos 20 países que o projeto verificou. Deste número, 7.400 gatos dos 10 milhões e 177.600 cães dos 20,2 milhões vivem em abrigos, totalizando 185 mil de cães e gatos em abrigos. É importante ressaltar que quando analisa-se a fonte desses dados para o Brasil no site da iniciativa, o estudo utiliza dados do Instituto Pet Brasil, World Animal Protection e Humane Canada, 2020, fontes essas que não citam a metodologia e o embasamento científico da fonte dos seus dados. A incapacidade de fornecer estatísticas razoavelmente válidas relacionadas a essa preocupação no Brasil ainda segue sendo um desafio, tornando difícil oferecer dados completos e precisos que são essenciais para planejar programas de manejo destas populações, visto que o abandono é identificado como um dos principais problemas na dinâmica populacional animal.
Com relação aos dados a partir de entrevistas foi demonstrado que de uma amostra composta por 497 tutores de cães e 439 tutores de gatos, 28% dos cães e 53% dos gatos são castrados. Em relação ao local onde as pessoas obtiveram os seus pets, no caso dos cães as cinco principais respostas foram: amigo/parente (47%), de rua/eu achei (11%), nasceu em casa (8%), criador e centro de resgate/abrigo (7%). Já no caso dos gatos as cincos principais respostas foram: de rua/ eu achei (33%), amigo/ parente (32%), nasceu em casa (10%), resgatado/abrigo (8%) e pet shop (5%). Quando indagados sobre o que a pessoa faria em caso de encontrar um pet abandonado, os tutores de cães realizam ato de bondade (49%), não fazem nada (39%) ou se espantam (6%), e os tutores de gatos responderam que realizam ato de bondade (48%), não fazem nada (38%) ou se espantam (2%).
Com base nas opiniões coletadas junto aos tutores de pets sobre potenciais soluções que possam ser aplicadas para reduzir o número de animais abandonados, em uma amostra de 743 que já foram ou são tutores de cães e 516 que já foram ou são tutores de gatos, há uma predominância em resposta sobre combater a crueldade animal, seguido por iniciativas em promover programas de adoção, oferecer cuidados veterinários gratuitos e esterilização, além de apoiar programas que conectem pessoas aos abrigos. Essas ações visam não apenas fornecer assistência direta aos animais, mas também educar o público sobre a importância da guarda responsável.
Outro questionamento realizado na pesquisa, com uma amostra de 1241 tutores e não tutores, retrata que 53% das pessoas têm o interesse em adotar um cão em um futuro próximo e 37% um gato. No entanto, apesar do desejo expresso por muitos de adotar um animal de estimação, há obstáculos significativos que impedem as pessoas de fazê-lo. As principais barreiras respondidas em uma amostra de 498 pessoas sem cães, são relacionadas a condições de moradia inadequadas, custos elevados, restrições de permissão, disponibilidade para cuidar do animal durante o trabalho e durante as férias; para as 725 pessoas sem gatos entrevistadas são relacionadas a alergia por algum membro da família, por já ter outros animais, por ter tido uma experiência anterior negativa, por condições inadequadas moradia, por problemas nas férias e porque eles transmitem doenças.
Sobre a adoção de animais que estão em abrigos, 36% consideraram adotar um cão e 45% adotar um gato, o que torna evidente que há uma oportunidade para mudar a percepção em torno dos animais resgatados, o que poderia facilitar sua transição dos abrigos para lares com tutores. Isso poderia ser alcançado através de campanhas de conscientização, destacando as qualidades únicas dos animais em situação de abrigo e o impacto positivo que a adoção pode ter tanto na vida do animal quanto na vida do adotante.
O estudo revelou que cerca de um terço dos cães e gatos já foram perdidos, com 31% dos gatos e 39% dos cães perdidos, de uma amostra de 1160 participantes que possuem ou já possuíram um pet. As taxas de recuperação são baixas, com apenas 33% dos gatos e 35% dos cães sendo encontrados. Incentivar a implantação de microchips como maneira identificar permanentemente os animais de estimação pode ser benéfico, pois atualmente apresentam uma taxa baixa com apenas 10% dos gatos e 8% dos cães microchipados em uma amostra de 497 atuais tutores de cães e 439 atuais tutores de gatos.
Quando questionados se os tutores consideram renunciar seus animais nos próximos 12 meses, em uma amostra de 497 tutores de cães e 439 tutores de gatos, 11% retrataram que sim para cães e 13% para gatos. E dentre os motivos que levaria a pessoa a doar seu animal, as cinco principais respostas foram que a pessoa não está mais disposta fisicamente para tomar conta, por mudança, por falta de tempo de cuidar como gostaria, por um membro da família ser alérgico, e pelo comportamento inapropriado.
O estudo traz pontos importantes do ciclo de abandono e fornece dados e insights sobre áreas de ações críticas para enfrentar o desafio dos animais de estimação sem abrigo. Entretanto, com relação os dados referentes ao número de animais em situação de abandono e em abrigos, ainda não possuímos dados fidedignos que reflete a verdadeira realidade em nosso país. Abordar o problema do abandono animal requer uma abordagem multifacetada que requer a implementação de políticas públicas eficazes de manejo populacional de cães e gatos, que pauta por diversas estratégias que vão desde a necessidade de compreender os dados precisos da dinâmica populacional dos animais, até a promoção da adoção e guarda responsável.