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Dermatozoonoses: Relevância e Impacto na Saúde Única e Coletiva

Autora: Juliana M.C Vieira

Revisora: Paula Bastos

As dermatozoonoses são infecções de pele que acometem tanto animais quanto seres humanos, que são transmitidas entre espécies e que tem como  agentes etiológicos fungos, parasitas e bactérias. Essas zoonoses têm grande relevância pois a interação próxima entre humanos e animais domésticos aumenta o risco de transmissão, afetando a saúde individual e coletiva.

No contexto da Saúde Única, que integra as dimensões da saúde humana, da animal e da ambiental, o controle dessas doenças exige uma abordagem colaborativa e interdisciplinar. 

Este texto destaca, brevemente, a importância da esporotricose e da leishmaniose, duas dermatozoonoses emergentes e de grande impacto no Brasil.

O controle dessas doenças é fundamental para evitar surtos que podem gerar grandes impactos na saúde pública, como a sobrecarga dos sistemas de saúde e prejuízos econômicos (RIVIERE e PAPICH, 2021). Além disso, a colaboração interdisciplinar entre profissionais da saúde é crucial para garantir a vigilância e o controle eficaz das zoonoses (CHITTY; HENDRICKS, 2007).

A Saúde Única e a Abordagem Interdisciplinar no Controle de Zoonoses

O conceito de Saúde Única reconhece que a interdependência entre os fatores humano, animal e ambiental é vital para o controle eficaz de zoonoses.   A esporotricose e a leishmaniose exigem uma resposta coordenada na qual médicos, médicos veterinários, biólogos, profissionais de saúde pública e ambientalistas trabalhem em conjunto (BARBOSA JUNIOR et al., 2024). Essa abordagem integrada vai além do tratamento de casos individuais, abordando também questões de saúde pública.

Esporotricose: Desafio Urbano em Ascensão

esporotricose, causada por fungos do gênero Sporothrix, especialmente Sporothrix brasiliensis, é uma das dermatozoonoses mais importantes no Brasil. Com o aumento significativo de casos nas últimas décadas, especialmente em áreas urbanas, a esporotricose se destaca como uma ameaça crescente à saúde pública. Os gatos domésticos, que transmitem o fungo por meio de mordidas e arranhaduras, desempenham um papel central na disseminação dessa zoonose, causando lesões cutâneas em humanos, que entram em contato com eles (GREMIÃO et al., 2015).

De acordo com Rabello et al. (2020), o Brasil tem enfrentado uma verdadeira epidemia de esporotricose, particularmente no estado do Rio de Janeiro, onde se concentra o maior número de casos documentados, desde 1998. O estudo de Rabello e colaboradores revelou que entre 1907 e 2020, foram reportados 12.522 casos humanos de esporotricose no Brasil, com 89,8% desses casos ocorrendo a partir de 1998, evidenciando o  aumento explosivo da doença nos últimos anos. Esse aumento está associado à expansão urbana e à superpopulação de gatos em áreas densamente povoadas, tornando a esporotricose uma preocupação crescente para as políticas públicas de saúde.

A prevalência elevada em áreas densamente povoadas, como Rio de Janeiro, demanda políticas públicas integradas de vigilância e controle (OLIVEIRA et al., 2020; ROSOW et al., 2020). As diretrizes para o manejo da esporotricose felina na América do Sul reforçam a necessidade de uma abordagem unificada entre os setores da saúde humana e animal (GREMIÃO et al., 2020).

Leishmaniose: Impacto Endêmico e Vigilância Contínua

Outra dermatozoonose de relevância no contexto da Saúde Única é a leishmaniose, causada por protozoários do gênero Leishmania e transmitida por insetos  flebotomíneos.

A leishmaniose cutânea resulta em lesões ulcerativas na pele de difícil tratamento, afetando tanto animais quanto humanos. Em regiões endêmicas, como o Nordeste do Brasil, a doença representa um desafio contínuo à saúde pública, exigindo estratégias de controle que envolvam o monitoramento dos vetores, diagnóstico precoce e tratamento (SPINOSA et al., 2017; RIVIERE e PAPICH, 2021).

O Papel do Médico Veterinário na Saúde Única

O médico veterinário tem um papel central na prevenção e controle de dermatozoonoses, sendo frequentemente o primeiro profissional a identificar casos  entre os animais. Além de diagnosticar e tratar as infecções em animais, o médico veterinário deve educar os tutores sobre práticas seguras e preventivas, colaborando diretamente com autoridades de saúde pública na formulação de programas de controle (GREMIÃO et al., 2020). Essa colaboração interdisciplinar, focada em uma abordagem de Saúde Única, é fundamental para conter a disseminação dessas doenças e proteger tanto a saúde animal quanto a humana (BARBOSA JUNIOR et al., 2024).

Somente com a colaboração interdisciplinar entre médicos veterinários, médicos e profissionais de saúde pública será possível enfrentar, adequadamente, essas ameaças emergentes à saúde global.

Referências

BARBOSA JUNIOR, S. A. et al. A inserção da Medicina Veterinária em uma Residência Multiprofissional em Saúde da Família e Comunidade: um relato de experiência. Revista Saúde em Redes, v. 10, n. 1, p. 1-11, 2024.

CHITTY, J.; HENDRICKS, A. Zoonotic skin disease in small animals. In Practice, v. 29, p. 92-97, 2007.

GREMIÃO, I. D. F. et al. Guideline for the management of feline sporotrichosis caused by Sporothrix brasiliensis in South America. Journal of Feline Medicine and Surgery, v. 22, n. 9, p. 831-849, 2020.

GREMIÃO, I. et al. Feline sporotrichosis: social vulnerability and prioritization of geographic areas in Guarulhos, SP, Brazil. Braz J Vet Res Anim Sci, v. 58, e188291, 2021.

RABELLO, V. B. S. et al. The Historical Burden of Sporotrichosis in Brazil: a Systematic Review of Cases Reported from 1907 to 2020. PLOS Neglected Tropical Diseases, v. 14, p. e0008415, 2020.

ROSOW, T. S. et al. Environmental Sporotrichosis: Spatiotemporal Analysis of Sporothrix spp. in the State of Rio de Janeiro, Brazil. Medical Mycology, v. 58, p. 210-220, 2020.

RIVIERE, J., PAPICH, M. G. Adams Booth – Farmacologia e Terapêutica Veterinária. 10ª ed. Grupo GEN, 2021.

SPINOSA, H. de S. et al. Farmacologia Aplicada à Medicina Veterinária. 6ª ed. Grupo GEN, 2017.